quando a vó quis morrer em casa
por Carol Stampone |
Ainda lembro dela, em frente a casa, a mão estendida em sinal de adeus. Eu quis acreditar que era apenas até logo. Ela sabia que não.
Não voltamos a nos ver. Eu parti. Ela também quis que eu partisse. Disse que eu tinha uma vida inteira pela frente. Mas, para ela era diferente.
Eu tentei argumentar. "Vó, quase toda a gente já partiu". "A senhora não vê quantas casas foram destruídas pelas bombas? E se a próxima bomba cair encima da nossa casa?" Ela não dizia palavra. Só ia metendo as minhas roupas dentro da mala e vez ou outra balançava a cabeça de um lado para o outro.
Eu cheguei nesse outro mundo. Não foi uma viagem fácil. Também não foi das mais difíceis. A vó vendeu por quase nada as jóias que tinham sobrado. Com o dinheiro pagou para que me trouxessem até aqui. Ela tinha o suficiente para trazer as duas. Mas estava decidida a não partir, apesar da certeza de que a guerra não ia acabar logo.
Será que a vó era suicida? Era não.
Será que a vó era suicida? Era não.
Na noite antes da partida, a vó achou que eu dormia. Aproximou-se de mim e pediu desculpas. Pediu desculpas por fazer-me deixar o meu mundo sozinha. Mas eu ao menos tinha a juventude ao meu lado. Para ela era tarde demais para aprender a morrer em outro lugar. Foi o que ela disse. E continuou, entre lágrimas miúdas:
_ É essa a minha casa! É essa a minha terra! Só posso morrer aqui.
Ela ficou e morreu pouco depois que eu parti. Uma das bombas atingiu-lhe a casa, os ossos cansados e o sangue que já não sabia carregar o sol. Ela não foi enterrada na terra querida. Sobrou misturada aos restos daquela injustiça que invadiu-nos a casa e as vidas.
um abraço e inté a próxima
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