Violette




Violette é um filme sobre a vida da escritora francesa Violette Leduc, que, de certo modo foi uma marginalizada. Não apenas por ser mulher, mas também por ser uma bastarda e feia, ou ao menos era assim que ela se via. Todo o filme é atravessado pela presença de Simone de Beauvoir, que foi editora e amiga de Violette. Como bem colocou Simone de Beauvoir em uma entrevista, a história de Violette é "uma história de salvação pela literatura". 

Violette é uma mulher atormentada pela solidão. Uma bastarda. Ela repete que ninguém a quer e que está sozinha. A mãe que a trouxe ao mundo mas nunca a quis. O pai que nunca a quis. Pelo meio do caminho os inúmeros amores aos quais ela se atira, desesperadamente, sem ser correspondida.
O primeiro dos amores mostrado no filme é Maurice.
Maurice Sachs. Foi ele quem a incitou a escrever. No filme ele literalmente atira-lhe um caderno a cara, depois de mais uma das crises de auto piedade dela, em que ela implora para que ele a ame. Ela chega a dizer para que ele feche os olhos e pense que ela é outra pessoa, durante o ato sexual. Ele atira-lhe o caderno a cara e diz: "Pegue este caderno. Vá se foder gostoso debaixo de uma macieira. Cuspa no papel tudo o que faz você ser tão insuportável. Todo mundo vai ficar melhor. Você, em primeiro lugar".
Violette escreve sobre o que pode. Sobre si mesma. Sobre a sua própria história. A história de uma mulher que está só, que se sente feia, abandonada e não entendida. A históra de uma mulher que amou outra mulher. Primeiro. Mas esse amor não foi aceito, foi proibido, abafado, escondido. 
Mais tarde, para tentar apagar o erro de amar outra mulher, para tentar caber nos sapatos da normalidade, Violette acaba se casando com um homem. Engravida. Mas ela não acha em si e nessa relação forças e verdade para seguir em frente. Acaba optando por um aborto, durante o qual quase morre. Depois deixa o casamento acabar. Libera-se dele. Volta a estar sozinha. Sobrevivendo como pode. No meio do caminho, enquanto trabalha no mercado negro, durante a Ocupação nazista em França, encontra um livro de Simone de Beauvoir. Identifica-se com o que lê e por isso vai procurar a intelectual com um ramo de flores e o seu livro 'Asfixia' em mãos. 
Simone de Beauvoir gosta muito do que Violette escreve, explica que porque em seus livros Violette não se esconde, pelo contrário, ela se expõe, se encontra. Ao expor a si mesma Violette acaba falando dos lugares negados às mulheres na sociedade. Quando Violette deixa a caneta falar, acaba abordando temas como a sexualidade reprimida das mulheres, a falta de liberdade das mulheres, a ditadura da beleza a que as mulheres estão expostas, a falta de lugar para o lesbianismo, enfim, assuntos ainda hoje tão atuais. 
No meio do caminho há complicações na relação entre Violette e Simone, porque a segunda torna-se alvo de uma paixão desenfreada de Violette, quase um delírio amoroso. Mas, apesar disso, Simone nunca se afasta completamente de Violette. A editora e amiga insiste para que Violette continue escrevendo. 
"Escrever lhe dará o que a sociedade lhe negou. Mas isso leva tempo. Continue escrevendo. Trabalhe".
Violette ouve a amiga e continua escrevendo. 
'Asfixia' e 'A Faminta', os dois primeiros livros de Violette, apesar de terem sido um sucesso de crítica, não foram um sucesso de venda. Ela não soube como lidar com mais essa frustração, com mais essa situação onde ela sentia que não era querida, não era amada. Depois que o seu livro 'Destroçoes' sofreu drásticos cortes, por ser considerado ofensivo_ por descrever cenas sexuais entre duas mulheres_ Violette teve um surto. Foi como se o livro e ela tivessem sido mutilados juntos. Ela sangra enquanto as páginas do livro são arrancadas. 
Com o suporte de Simone de Beauvoir, Violette vai para uma clínica de recuperação. Quando sai de lá, a mãe cuida dela, como se fosse de novo uma criança, lhe dá banho, lhe veste, lhe acarinha. Acho que a cena é para marcar uma espécie de renascimento da escritora. Renascimento esse que vai ser, de certo modo, também incitado por Simone de Beauvoir. 
Em um momento de desespero, Violette explode com a amiga e editora, diz que é tudo culpa dela, pois foi ela quem a convenceu de que ela poderia escrever, quando a verdade é que ela não pode, afinal, ninguém quer comprar os seus livros. 
Simone de Beauvoir incita-a a recomeçar do começo, outra vez. Recomeçar a contar a própria historia, do começo outra vez. 
É o que Violette faz. Dessa vez, meio a viagens, escreve 'A Bastarda', que torna-se um sucesso de vendas. O primeiro sucesso de Violette, que, de fato, salvou-se através da literatura e continuou escrevendo para viver.
No prefácio de 'A Bastarda', escrito por Simone de Beauvoir, encontramos uma descrição precisa desse livro único, que merece ser lido: " Se lemos A Bastarda, o sonho se realiza, ou quase. Uma mulher desce ao mais secreto de si mesma e se revela com uma sinceridade intrépida, como se não houvesse ninguém para escutá-la". 

Que mais mulheres salvem a si mesmas através da literatura! E que elas sejam ouvidas! Além! 

O filme pode ser assistido em: http://www.filmesonlinegratis.net/assistir-violette-legendado-online.html

um abraço e inté a próxima, 

Comments

Popular posts from this blog

Os amantes do café Flore: Beauvoir e Sartre

Conversando com “Vozes Mulheres” de Conceição Evaristo

Strangers de Taichi Yamada