o homem de branco tem resposta e pílula para tudo
_ Doente! Doente! Doente! Doente!
Incapaz! Doente! Doente! Quase doente! Doente! Distribuam as pílulas
cor de rosa para os números 1, 2, 3, 4, 6, 7 e 9 e para os demais
as azuis. Mande entrar o próximo grupo, Joana.
É para isso que estamos a caminhar?
Uma sala, com um homem vestido de branco, a substituir deus, e a
distribuir as pílulas para a felicidade de acordo com os sintomas
apresentados?
_ Somos uma
sociedade doente.
_ Ah, sim? Quem
disse?
O homem de
branco. E ele não mente. Ele disse que o meu irmão estava louco e
era verdade. No começo, toda a gente estranhou. Afinal, meu irmão
ainda era só um menino. Dezenove anos acabadinhos de fazer. Estava
na faculdade e só tirava as melhores notas. Daí começou a ficar
triste de um jeito que doía ver. Fomos procurar o homem de branco.
Ele conversou com o meu irmão por sete minutos e já soube que o meu
irmão estava louco. Para salvar ele da loucura receitou uma lista
com pílulas para estar acordado e outras para dormir. 'Pílulas para
que ele aguente a realidade'_ foi o que o homem de branco disse. Ele
explicou que os loucos não são bons em agüentar a realidade. O meu
irmão agüentou por dez anos, enquanto tomou as pílulas direitinho.
Sempre continuou triste. Uma vez perguntei para o homem de branco:
_ por que? Por que
é que ele continua tão triste, doutor?
O homem de branco
nem se deu ao trabalho de me olhar nos olhos. Disse que já era
tarde, ele tinha pacientes esperando. Eu tinha que ir. Eu disse que
não podia partir sem ter uma resposta. O homem de branco ainda
tentou me convencer a esquecer as perguntas mais difíceis. Perguntou
se também eu não precisava de pílulas. Eu podia escolher, ãh.
Azuis ou cor de rosa? O que ia ser. Eu insisti que só queria mesmo
uma resposta, obrigada. O homem de branco suspirou decepcionado e
jogou-me encima:
_ Vai ver um louco
não é capaz de ser feliz.
Eu voltei para
casa decidido a nunca mais escutar o homem de branco. Podia até ser
que ele tivesse resposta para tudo. O problema é que ele era surdo.
Atirava respostas a deus dara, do mesmo modo que atirava
as pílulas cor de rosa e azuis. Pudera eu ter percebido a
charlatanice do homem de branco quando o meu irmão ainda existia.
Caroline...
ReplyDeleteO famoso jaleco branco que nos intimida tanto diante do médico.
É verdade, todos nós temos um momento de loucura e acho que na verdade vem para nos fazer bem, sair do politicamente correto.
Abraços sempre...
Luandabela.
Oi Luandabela,
DeleteNa minha opinião, os homens e mulheres de branco precisam cuidar do ser humano, enxergá-lo, tratá-lo e não rotulá-lo e medicá-lo sem precisão. Temos que parar de inventar loucos e depressivos as pencas. Essa invenção simplesmente enriquece a indústria farmaceutica e empobrece a humanidade, que sobra artificialmente homogênea. Todos igualmente felizes e normais...
Às vezes tenho medo dessa sociedade onde a tristeza virou coisa proibida e falta espaço e tempo para existir em todas as estações do ser. Somos forçados a existir sempre verão, ensolarados, mesmo que a base de pílulas, para ficar acordado e para dormir.
um abraço,
Carol Stampone