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Showing posts from June, 2016

A morte do pai parte II: o pai, o filho, o escritor e outros

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Como prometido, hoje volto a falar de 'A morte do pai', o volume I da novela autobiográfica em seis volumes do autor norueguês Karl Ove Knausgaard. Quem ainda não leu as minhas primeiras divagações sobre o assunto pode dar uma espiadinha aqui . Hoje falo menos das minhas obsessões e me aproximo um tiquinho mais das verdades vomitadas pelo autor. Um homem, que um dia foi um menino, um filho, virou um pai, um marido, continuou sendo um irmão, escolheu ocupar o mundo no lugar de um estrangeito, fez-se escritor, depois prometeu que nunca mais iria escrever. Mas, não desesperem-se. Ele mudou de ideia. Quando Knausgaard lembra ele não esconde-se atrás das primaveras da vida. Ele não descreve apenas cheiros bonitos. Interessa-lhe cheiros reais, por mais inapropriados que esses possam ser. Quando ele viaja através da sua própria vida, e divide verdades de memória, ele usa todos os seus pedaços, explora todos os seus papéis. Divide as certezas e dúvidas que marcaram

Doce arte de j.artur

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há quem veja só pedra, mas, a verdade é que ainda há flores que resistem a dureza e acham onde existir Doce arte de J.artur é um texto com cheiro de dia a dia, que acaba por revelar-se uma dupla declaração de amor. A declaração de amor de um amigo à uma amiga e a declaração de amor à doçura, à bondade, à “vida que vale a pena se a alma não é pequena”. J.artur confessa que têm obsessão por gente, pelo o que a gente sente. Segundo a prosa poética dele mesmo: “ eu tenho obsessão pelas pessoas, pelo sentimento - delas, nelas, o que me causam, etc - pela vida alheia que, tal qual o oceano e o céu, apesar de tão distantes, separam-se por uma linha tão tênue, sabe? nós seres humanos somos todos tão parecidos e tão diferentes. (...) não consigo imaginar o que é não sentir nada”. Quando lemos 'Doce arte' encontramos esse ser humano, esse escritor, que decide, a cada palavra escrita, dizer sim à arte, à beleza, aos sentimentos. Decide também dizer não à indiferença. As escolha

a morte do coronel

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Era a primeira missa do ano. Era para ser uma missa para pedir à deus um ano sem miséria e sem violência. Mas, por causa da morte morrida do coronel virou outra coisa. A igreja não estava meio vazia, como sempre. Dessa vez a cidade inteirinha veio. Os que acreditavam em deus e os que desacreditavam também. Tinha gente que estava ali para rezar pelo padrinho. Homem bom e justo, que cuidava dos seus. Outros estavam ali para ter certeza que o diabo do coronel tinha parado de existir mesmo. Para aqueles que não seguiam a cartilha do dono daquelas bandas, aquela morte era uma sementinha de esperança, esperança de que a liberdade ia finalmente florescer naquelas terras. No comprido discurso, o padre, mais um dos aliados do coronel, floreou muita história. Falou de tudo que o coronel tinha construído. Na verdade, ele tinha mandado contruir. Mas o padre falou que ele é que tinha construído mesmo. Como se ele, com as próprias mãos e suor tivesse erguido a igreja, as casas do bairro p

A morte do pai parte I: a death in the family, o bybanen e eu

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A morte do pai é o título do primeiro volume da novela autobiográfica do autor norueguês Karl Ove Knausgaard, que será uma das atrações principais da FLIP 2016. Na tradução em português 'A morte do pai'.  Li 'A morte do pai' nas minhas idas e vindas do Bybanen em Bergen. Bybanen é uma espécie de trenzinho da cidade. O bybanen aqui de Bergen te carrega de Byparken até Lagunen, uma viagem que dura mais ou menos meia hora. Eu meto-me no bybanen quase todos os dias, para ir e voltar do trabalho. Como costumava fazer no metrô de São Paulo, na volta do trabalho_ porque na ida não conseguia nem mover os braços, de tão cheio que o 'trem' estava_ leio. Gastei as minhas últimas viagens lendo a tradução para o inglês desse livro. O título em inglês, 'A death in the family' (uma morte na família) revela bem menos que o título em português. Permito-me divagar mais um pouco. Eu tenho uma certa obsessão pela família. As minhas histórias são repletas de