a morte do coronel
Era a
primeira missa do ano. Era para ser uma missa para pedir à deus um
ano sem miséria e sem violência. Mas, por causa da morte morrida do
coronel virou outra coisa. A igreja não estava meio vazia, como
sempre. Dessa vez a cidade inteirinha veio. Os que acreditavam em
deus e os que desacreditavam também.
Tinha gente
que estava ali para rezar pelo padrinho. Homem bom e justo, que
cuidava dos seus. Outros estavam ali para ter certeza que o diabo do
coronel tinha parado de existir mesmo. Para aqueles que não seguiam
a cartilha do dono daquelas bandas, aquela morte era uma sementinha
de esperança, esperança de que a liberdade ia finalmente florescer
naquelas terras.
No comprido
discurso, o padre, mais um dos aliados do coronel, floreou muita
história. Falou de tudo que o coronel tinha construído. Na verdade,
ele tinha mandado contruir. Mas o padre falou que ele é que tinha
construído mesmo. Como se ele, com as próprias mãos e suor tivesse
erguido a igreja, as casas do bairro popular, o prédio novo da
prefeitura, o clube. O padre ergueu os braços para o alto e pediu
que todos fizessem silêncio. O silêncio era sinal de respeito,
gesto em direção à salvação de um velho rico, que tinha matado
muita gente, mas que também tinha dado muito dinheiro para a igreja.
Ninguém falava das mortes encomendadas, só da estátua de Nossa
Senhora da Aparecida que tinha vindo da Itália, paga com o dinheiro
do morto.
A história
oficial ia esquecer os jagunços todos do coronel e o sangue e o suor
de tantos que ele matou a bala, ou devagarinho, com exploração
cotidiana. No fim das contas o coronel, suposto 'homem de bem', virou
nome de rua.
O Antônio,
que toda a gente conhecia como Toninho, tentou dizer que não estava
certo. O nome antigo da rua era Liberdade. Não era direito trocar a
liberdade pelo nome do coronel. Mas, dona Aurora, mulher de muita sabedoria, foi logo puxando o Toninho pelo braço e explicando que era melhor ele ficar quieto. Não era seguro dizer aquelas verdades.
_ Vai que o filho do coronel resolve virar bicho ruim que nem o pai, Toninho? Ocê ainda não aprendeu, rapaz, que por essas bandas o coronel é dono de tudo, até da liberdade.
_ Vai que o filho do coronel resolve virar bicho ruim que nem o pai, Toninho? Ocê ainda não aprendeu, rapaz, que por essas bandas o coronel é dono de tudo, até da liberdade.
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