Incidente em Antares e Getúlio Vargas Parte I
Um dos personagens históricos trazidos a tona em Incidente em Antares é Getúlio Vargas. Érico Veríssimo introduz o famoso ditador brasileiro como um dos filhos do coronelismo. Um homem que respeita a necessidade do apoio dos coronéis para se eleger (ou para meter-se no poder a força). É por isso que o Baixinho_ é assim que o coronel Vacariano irá referir-se à Getúlio ao longo da vida_ vai até Antares. Não trata-se de uma visita de cortesia, mas de uma jogada política. O Baixinho quer garantir a paz entre os dois meios donos da cidade: Coronel Vacariano e coronel Campolargo. Assim, não tera meia cidade do seu lado, mas, uma cidade inteira.
Incidente em Antares de Érico Veríssimo está disponível para download e leitura em http://www.igtf.rs.gov.br/wp-content/uploads/2012/04/ERICO_incidente_em_antares.pdf
"Um dia, no princípio do verão de 1925, apareceu sorrateiro em Antares um membro da prestigiosa família Vargas, de São Borja. Chamava-se Getúlio, tinha quarenta e dois anos de idade, era bacharel em Direito, e ocupava então uma cadeira de deputado na Câmara Federal, como representante do Partido Republicano de seu Estado. Homem sereno, de feições e maneiras agradáveis, sabia usar a cabeça com lúcida frieza e possuía qualidades carismáticas ainda não de todo reveladas plena e publicamente. Dizia pouco, mas perguntava muito. Frio, soberbe, sabia jogar com dois fatores importantes na vida: o tempo e as fraquezas humanas".
Foi jogando com o tempo e com as fraquezas humanas que Getúlio Vargas chegou ao poder duas vezes. Da primeira vez o coronel Vacariano foi um de seus fiéis apoiantes. Depois do golpe que garantiu à Getúlio a cadeira de soberano da nação, o coronel Tibério Vacariano foi passar uns tempos na capital para cobrar a paga pelo seu apoio político. O coronel criou uma suposta firma de advocacia, onde vendia nada mais, nada menos que sua influência política, ou seja, seu acesso ao Baixinho.
O coronel Vacariano durante o tempo das vacas gordas gritava aos quatro ventos que Getúlio era o homem certo para tomar as rédeas do Brasil. Dizia aos seus botões que o tal Estado Novo tinha sido "um golpe genial do Baixinho para continuar no poder sem os trambolhos do Congresso e dos partidos políticos". Numa conversa com seu amigo Zózimo Campolargo o coronel Vacariano defende Getúlio assim:
"_ Precisas compreender, homem, que os tempos mudaram... (...) É preciso reformar as velhas estruturas chamadas democráticas liberais. O Getúlio compreendeu a coisa. Somos um país subdesenvolvido de analfabetos e indolentes. É indispensável unificar e organizar a nação com punho de ferro. Vê o caso da Itália. O Mussolini acabou com a anarquia, implantando a ordem e o respeito à autoridade, e os trens já partem e chegam dentro do horário".
No entanto, quando a vida política de Getúlio saiu dos trilhos_ o Baixinho foi forçado pelas forças armadas a retirar-se do poder_ o coronel Vacariano foi um dos primeiros a fazer-se de morto. Não foi visitar o ex amigo em Borjas e não ofereceu-lhe solidariedade ou apoio, apesar de continuar admirando a inteligência e a esperteza de Getúlio.
Obviamente quando Getúlio orquestrou sua volta ao poder nos braços do povo, o coronel Vacariano tentou retomar as boas com o Baixinho. Mas, Getúlio disse não aos seus diversos pedidos de visita.
Desde então o coronel Tibério Vacariano só ouviu falar de Getúlio pelas notícias. A verdade é que nunca deixou de admirar o Baixinho. Sempre acompanhou a trajetória política do mesmo. E foi um dos muitos a bradar em voz alta que as coisas começavam a desandar. É que o Baixinho tinha começado a meter-se em muitas contradições. Tinha aquele Jango no Ministério do Trabalho, certo que Getúlio o demitiu, devido a pressão da oposição. Mas, já era tarde. E todo aquele envolvimento com o lado errado. O lado do povo?
"A própria História _ como lhe havia dito um amigo de boas letras_ conspirava contra o regime getulista, cujas contradições eram demasiado visíveis e haviam ficado ainda mais gritantes quando, no ano seguinte, o Brasil mandou uma Força Expedicionária à Itália, para lutar ao lado dos americanos, em nome da democracia, contra o totalitarismo hitlerista, enquanto Getúlio Vargas mantinha em casa uma versão paternalista de fascismo".
Por fim, Getúlio foi mesmo obrigado a retirar-se, outra vez. Mas, dessa vez, ao invés de retirar-se da cadeira de ditador, preferiu retirar-se da vida, para entrar para a história. O coronel Tibério percebeu que aquele tinha sido o último golpe do Baixinho. Admirou a esperteza do mesmo, mais uma vez. Mas acabou não indo ao enterro de Getúlio por medo de ser destratado por algum parente que soubesse dos desencontros dos dois.
Sobre a carta testamento de Getúlio Vargas o coronel Tibério afirma: "É um documento infernal. Representa o último e maior golpe do Homem. Custou-lhe a vida, é verdade. Mas, foi uma vitória do mago de São Borjas. (...) O Getúlio com essa carta varre a sua testada, salva-se como homem e como estadista, encontra uma saída honrosa para uma situação pessoal difícil, apresenta-se como mártir do povo, candidata-se à História, vinga-se dos inimigos, atirando nos ombros e nas consciências deles o seu próprio cadáver, e ao mesmo tempo (prestem bem atenção no que estou dizendo!), ao mesmo tempo entrega ao João Goulart e ao P.T.B um programa político e uma bandeira de guerra. E como têm força essas bandeiras ensanguentadas".
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um abraço e inté a próxima
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