gosto e não gosto: um exercício pela metade

Conhece aquele velho exercício de escrita do gosto e não gosto? Para quem não conhece é um desses exercícios super simples, em que @ escrevinhad@ r despeja, de um jeito poético ou proseiro, seco ou cheio de voltas, enfim, despeja uma lista cheia daquilo que gosta ou gostaria de gostar e a contrapõe à tudo aquilo que não gosta, não pode gostar ou só não aprendeu a gostar mesmo.
O que divido com vocês hoje é um exercício do gosto e não gosto, feito pela metade.
Num dia ensolarado, resolvi enumerar apenas um punhado de coisas que gosto

por Carol Stampone

gosto do sorriso arteiro da menina pequena que não dá ouvidos às exigências descabidas de que menina tem que sentar de perna fechada
gosto de terra onde o trem chega atrasado e ninguém tem pressa
gosto do cheiro da chuva incrustado na terra molhada que é casa da jabuticabeira mais dadeira da cidade
gosto de ser atropelada por entusiasmos alheios
gosto de uma cachorra velha que sabe entender o meu silêncio
gosto de renascer cada vez que o entusiasmo acha casa em mim
gosto de café com uma colherzinha de cacau em pó
gosto de reinventar saudades
gosto da água que sabe falar
gosto de abraçar árvores
gosto quando gosto de mim e sei gostar de dias cinzas e coloridos
gosto de todos os cães, porque inventei que eles sabem explicar a vida todinha num olhar
aprendi a gostar dos gatos, que só existem, sem precisão nenhuma de explicar nadinha ou confortar a solidão de ninguém
gosto de histórias
histórias contadas, escritas, filmadas, vomitadas, vividas
pela metade ou até o talo
gosto de me alimentar de histórias
gosto de plantar, comer e morrer histórias.

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